TRF-3 consolida entendimento de que a regra do circuito fechado é ilegal. Desembargadora reafirma que a restrição prejudica o consumidor e a concorrência no setor de transportes.
Por Maurício Macedo/Ascom
Foto: divulgação/Buser
Uma nova decisão da Justiça Federal fortalece o modelo Buser de viagens rodoviárias. A decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3), desta quarta-feira (1º/2), foi comemorada pela startup e pelas empresas fretadoras porque fortalece a jurisprudência favorável ao setor de fretamento e aos aplicativos de transporte rodoviário.
Concedida pela desembargadora federal Monica Nobre, da 4ª Turma do TRF-3, a liminar autoriza as viagens de ônibus em circuito aberto em todo o Brasil, permitindo assim que o grupo de viajantes da ida não seja o mesmo da volta. A decisão também volta a proibir que a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) faça novas autuações e apreensões de ônibus em viagens fretadas pela plataforma Buser, que é associada do autor da ação. Com isso, os fiscais da ANTT não podem mais alegar descumprimento da regra do circuito fechado, que obriga empresas de fretamento a transportarem os mesmos passageiros tanto na ida quanto na volta de uma viagem.
O circuito fechado no transporte por fretamento foi criado pelo Decreto Federal 2.521, de 1998. É uma das regras que mais atrapalha a inovação no segmento do transporte rodoviário atualmente.
Na decisão do TRF-3, a desembargadora Monica Nobre reforça o entendimento de que a norma não está amparada na Constituição. “Nesses termos, a imposição da observância ao “circuito fechado” constante do Decreto Federal 2.521/1998 configura, prima facie, violação ao princípio da legalidade, na medida em que a restrição imposta não tem amparo legal.”
A magistrada ressalta que “a estipulação do circuito fechado ao transporte por fretamento é desacompanhada de qualquer justificativa razoável, sendo inclusive prejudicial ao consumidor”. Ela destaca, ainda, o parecer da Secretaria de Advocacia da Concorrência e Competitividade (SEAE), da Secretaria Especial de Produtividade e Competitividade do Ministério da Economia (SEPEC/ME), que concluiu que o circuito fechado cria custos de transação e operação. “O que acaba impactando negativamente o preço das passagens ofertadas aos consumidores, dificultando a realização de novos modelos de negócios e a adoção de novas tecnologias – restrições que impedem a entrada de novos prestadores de serviço e que prejudicam a concorrência e o consumidor”, afirma a desembargadora federal.
O TRF-3 atendeu a um pedido de efeito suspensivo em apelação, protocolado pelo Sindicato das Empresas de Processamento de Dados e Serviços de Informática do Estado de São Paulo (Seprosp) no âmbito do mandado de segurança coletivo (5033119-06.2022.4.03.6100).
Veja a íntegra da decisão: https://bit.ly/novadecisaoTRF3
(Pedido de Efeito Suspensivo à Apelação nº: 5001433-26.2023.4.03.0000)
Histórico
Decisão semelhante já tinha sido proferida no início de janeiro, pelo desembargador federal Marcelo Mesquita Saraiva, também da 4ª Turma do TRF-3, liberando viagens rodoviárias no modelo Buser e proibindo autuações e apreensões de ônibus pela ANTT. Foi a primeira decisão a considerar ilegal a regra do circuito fechado em viagens por fretamento.
Mesmo com a liminar, fiscais da agência de transportes seguiram apreendendo ônibus que viajavam pela plataforma Buser, prejudicando dezenas de passageiros. Vários grupos foram impedidos de continuar a viagem em meados de janeiro, após a decisão, em trajetos como Rio de Janeiro - Belo Horizonte (MG), Boa Vista (RO) - Manaus (AM) e Campinas (SP) - Rio de Janeiro (RJ).
Projetos em Brasília tentam acabar com circuito fechado
Aliado às recentes decisões do TRF-3, um forte movimento no Congresso Nacional, por meio de uma coalizão de parlamentares e senadores que apoiam a pauta, tenta abrir caminho para que pequenos e médios empresários do setor de fretamento e as novas plataformas tecnológicas possam disputar o mercado de transporte rodoviário, sem prejudicar os milhões de passageiros que utilizam plataformas tecnológicas como a Buser. O segmento, ainda fortemente concentrado, movimenta cerca de R$ 20 bilhões por ano no Brasil.
Na Câmara dos Deputados, parlamentares vêm trabalhando para derrubar a regra do circuito fechado no transporte fretado. A ideia é que, pelo menos, as viagens em circuito aberto não sejam consideradas clandestinas e passíveis de apreensões de ônibus pela ANTT, o que tem acontecido com frequência desde março do ano passado, quando houve a publicação da Portaria 27, que criminaliza a operação de fretamento por aplicativo.
Em dezembro de 2022, a Comissão de Viação e Transportes (CVT) analisou e aprovou por ampla maioria dois projetos de decreto legislativo nesse sentido. Um deles é o PDL 494/20, que derruba o circuito fechado. O outro é o PDL 69/22, que anula a Portaria 27/22 da ANTT, regra que padroniza o procedimento de fiscalização e criminaliza os ônibus que atuam por aplicativo – desde que a portaria 27 entrou em vigor, quase 1.000 ônibus foram apreendidos por fiscais da agência, causando transtornos a milhares de passageiros que viajam por aplicativos.
Há cerca de um ano, o antigo Ministério da Economia, atual Ministério da Fazenda, por meio da Frente Intensiva de Avaliação Regulatória e Concorrencial (FIARC), já havia declarado que o circuito fechado é anticoncorrencial, viola as melhores práticas internacionais e traz prejuízo estimado em R$ 1 bilhão ao ano para o País, além de propor alteração da regulação para prever a categoria de fretamento colaborativo, ofertado via aplicativos ou plataformas digitais, por gerar benefício à população e nova demanda para o setor. Esse parecer, inclusive, foi citado pela desembargadora Monica Nobre na decisão desta segunda-feira (30/1) e pelo desembargador Marcelo Mesquita Saraiva.
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